No ambiente forense digital, onde a verdade se esconde em códigos e metadados, a figura do especialista é indispensável. No entanto, é crucial diferenciar dois profissionais que, embora trabalhem com o mesmo tipo de prova, têm missões e responsabilidades completamente distintas: o perito judicial e o assistente técnico. Essa distinção é a chave para entender como a prova digital é produzida e contestada no sistema de justiça.
Funções e Vínculos no Processo
A principal diferença entre os dois profissionais reside em sua função e no vínculo com o processo. O perito judicial é um auxiliar da justiça. Ele é um especialista, com conhecimento técnico em sua área de formação, que é nomeado pelo juiz para atuar de forma imparcial no processo. Seu objetivo é analisar os fatos e as evidências digitais de forma neutra, fornecendo um parecer técnico que ajude o magistrado a tomar uma decisão.
Em contrapartida, o assistente técnico é um profissional contratado por uma das partes envolvidas (o autor, o réu, o promotor ou o advogado). Seu papel é acompanhar o trabalho do perito judicial, fiscalizar a metodologia usada e, se necessário, apresentar um laudo técnico divergente que sustente a tese da parte que o contratou. Ele não tem a função de ser imparcial, mas sim de garantir o direito de defesa e o contraditório, agindo como um “advogado técnico” para seu cliente.
Responsabilidade e Imparcialidade Técnica
A responsabilidade do perito judicial é com a ciência, a técnica e a objetividade. Seu laudo pericial deve ser um documento técnico-científico que descreve o que foi encontrado nas evidências digitais (como um e-mail, um HD ou um celular), a metodologia utilizada e as conclusões imparciais que podem ser extraídas dos dados. Ele não opina sobre a culpa ou a inocência, mas apenas sobre os fatos que podem ser tecnicamente comprovados.
O assistente técnico, por sua vez, tem sua responsabilidade atrelada à estratégia da parte que o contratou. Isso não significa que ele possa forjar provas ou mentir. Sua função é utilizar seu conhecimento técnico para destacar pontos favoráveis à sua parte, questionar as conclusões do perito judicial, apontar falhas no procedimento ou até mesmo apresentar uma análise complementar. Ele atua para fortalecer a argumentação jurídica do seu cliente, sempre dentro dos limites da ética profissional.
Limitações na Atuação Profissional
O perito judicial tem como principal limitação a necessidade de atuar estritamente dentro dos limites da solicitação do juiz. Ele não pode ir além do que foi solicitado no “quesito” (as perguntas do juiz e das partes) e está restrito aos materiais e dados que foram oficialmente disponibilizados para a perícia.
O assistente técnico também tem suas limitações. A mais significativa é que ele não possui a autoridade para realizar a coleta da prova digital de forma autônoma. Essa prerrogativa é do perito oficial ou da autoridade policial. Sua atuação se inicia após a prova ser coletada, acompanhando a análise e, posteriormente, examinando o laudo produzido para, se for o caso, contestá-lo. Ele depende do acesso aos dados fornecidos pelo perito judicial.
A Complementaridade no Processo Judicial
Embora tenham papéis opostos, o perito judicial e o assistente técnico são complementares e essenciais para a qualidade do processo judicial. O perito judicial garante que a prova seja produzida com base em métodos científicos e de forma imparcial, fornecendo a base técnica para a decisão do juiz.
O assistente técnico, por sua vez, garante o direito ao contraditório e à ampla defesa, assegurando que o laudo oficial não seja aceito de forma acrítica. Sua atuação permite que a parte com menos recursos técnicos possa ter um especialista para examinar o trabalho do perito, identificando possíveis falhas, omissões ou interpretações equivocadas. A existência de ambos fortalece a prova e contribui para um julgamento mais justo e transparente.